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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

“Católico-progressista...”


Jornal Tribuna – 1962

Fiquei admirado um dia destes ao ouvir que é mau ser católico-progressista. Confesso que julgava outra coisa e nunca supus que por trás de tal designação se escondessem tão pérfidos sujeitos, que sob capa de santos, afinal tramam a perdição do mundo e a desgraça da humanidade. Assim como se trouxessem o terço na mão esquerda e um punhal na direita. Ou ao contrario; quer dizer, o punhal deve estar na esquerda..!
Pensava eu que um católico-progressista era uma pessoa que, além de crer em Deus e seguir a fé cristã, obedecendo à Igreja Católica, se comportava de harmonia com uma consciência social, que lhes advinha da própria doutrina social dessa mesma Igreja, preocupando-se com o cumprimento dos princípios expostos nas encíclicas pelos Papas que se debruçaram sobre os problemas humanos do seu tempo.
Em linguagem popular, eu poderei dizer que estava convencido de que um católico-progressista era um cidadão que por ser temente a Deus, não se contentara em tratar de solicitar com fervor a salvação da sua alma, prosternando-se perante os altares, e promovendo concomitantemente a salvação do seu corpo, prosternando-se, cá fora, perante os poderosos, além de buscar a indispensável tranquilidade de espírito, em relação ao seu semelhante (ama o próximo como a ti mesmo), dando regularmente a sua esmola.
Uma espécie de avença: o céu, a dois escudos por semana – ou mais, consoante as posses. Vide os exemplos edificantes dos cidadãos filantropos, a quem os bens morais até logram correspondência nas honrarias deste mundo, sob a forma de comendas, bustos, lápidas e outras consagrações.
Julgava eu que ser católico-progressista era mais que isso, que tanta vez não significa nada além de egoísmo e vaidade, comodismo e inconsciência desumana. Julgava eu que ser católico-progressista era ser católico e progressista. Isto é, viver a sua religião e lutar pelo progresso do homem; honrar a Deus e ser irmão do homem; ao fim e ao cabo honrar a Deus, sendo fraternalmente defensor de todos os homens. Quando os homens sofrem misérias, ser contra a miséria; quando os homens sofrem injustiças, ser contra a injustiça; quando os homens sofrem prepotências, ser contra a prepotência; quando os homens são explorados, ser contra a exploração; quando os homens são escravizados; ser contra a escravidão; quando os homens são ignorantes, ser contra a ignorância. Quer dizer; não ser retrógrado, ser avançado, não ser regressista, ser progressista.
Julgava eu que assim deviam ser todos os católicos; mas activamente, e não só por atitude, não só por ir à missa todos os domingos e tratar reverentemente a hierarquia da Igreja e sem ser da Igreja. Julgava eu que Jesus Cristo não tinha vindo ao mundo criar magníficos poemas para recitarmos de joelhos, pelos séculos dos séculos e sim ditar uma doutrina para se realizar.
Julgava eu que um católico era progressista na medida em que se esforçasse por realizar essa doutrina, tendo de arrastar até com perigos, os perigos personificados pelos sujeitos que cerram fileiras e apontam dedos quando não apontam armas contra os que desejam progresso, paz e fraternidade, e que sendo católicos, aspiram pela dignificação do homem que Deus criou à sua imagem e semelhança, e que ainda se arrasta por esse mundo além, em condições que até fazem duvidar dessa Verdade.
Julgava eu e julgo – pois dou ao diabo o que dizem esses fariseus que haviam de crucificar Cristo uma e cem vezes, se Cristo voltasse à Terra, e eles a governassem.

3 comentários:

  1. É por essas e por outras que eu cada vez menos teno paciência para religiões. A Fé é muito mais pura e singela, como deve ser Deus, se realmente existir. Já as religiões como instituições de poder e de norma de conduta na História Humana, só trouxeram guerras e divisões entre os povos, que supostamente deveriam ser irmãos, filhos do mesmo Deus ou Deusa.

    Hoje se confunde a fé com o fundamentalismo religioso. Sejam eles católicos, protestantes, judeus, islâmicos,hindus, etc, os extremistas procuram expandir o seu poder político, em nome da fé, usando da toleráncia de Estados Democráticos, para um dia dominarem o mundo.
    Um retrocesso da História Humana, aos tempos mediaveis, em que os valores e condutas serão ditados e sem direitos de refutação. E quem resolver pensar por si próprio, caírá na fogueira, ou será chicoteado em praça pública.

    Afastem de mim esse "cáli-ce" !

    Inshala e Deus queira, que antes desse dia chegar, os falsos profetas que abundam a nossa sociedade política mundial, do oriente ao ocidente, já tenham sido todos desmascarados pelos seus povos oprimidos.
    Amém

    António Maria

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  2. "...Quando os homens sofrem misérias, ser contra a miséria; quando os homens sofrem injustiças, ser contra a injustiça; quando os homens sofrem prepotências, ser contra a prepotência; quando os homens são explorados, ser contra a exploração; quando os homens são escravizados; ser contra a escravidão; quando os homens são ignorantes, ser contra a ignorância. Quer dizer; não ser retrógrado, ser avançado, não ser regressista, ser progressista...."

    E quantos políticos hoje no Brasil, Portugal, Moçambique e no mundo mantêm essa consequência de pensar, nos seus actos de política internacional?
    Basta ver como as Ditaduras avançam como parceiros comerciais dos mais diversos Estados Democráticos.

    O Agnóstico

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  3. Texto espetacular. Verdadeiramente escrito por um cristão autêntico , o que, infelizmente , está se tornando tão raro em nossos dias em que os " fariseus " tomaram conta da maior parte da cristandade. É com grande alegria que leio textos como este e vejo que nem tudo está perdido. Pois ultimamente tenho visto " cristaos" defendendo elites corruptas e exploradoras, " cristãos" ludibriando a boa fé do povo mais humilde e se enriquecendo às custas de sua ignorância . Enfim , quero concordar plenamente com o autor deste significativo texto , lembrando que Cristo veio trazer a "espada" , que significa a luta contra todo e qualquer tipo de injustiça e exclusão . Este é o verdadeiro sentido de sua própria vida, e esta é a verdadeira essência de vida de um cristão (verdadeiro).

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